o cara “do contra” na revista o globo

globo1407

Expoente da nova cena cultura do Pará, poeta circulou anônimo pela Flip

por Mariana Filgueiras | foto de Leo Martins

No pequeno poema que encerra o livro “Não precisa dizer eu também”, recém-lançado pela 7letras, o poeta e tradutor paraense Caco Ishak manda a astróloga mais famosa do mundo às favas: “Fuck you, Susan Miller. Best Regards, God.” Há algum tempo, Caco não está só mandando o céu, as estrelas, os planetas e seus satélites para aquele lugar. Mandou também o amor, o trabalho regular, a formação em Direito (que cursou por obrigação, diz). Só não mandou catar coquinho as três filhas — é uma só, Malu, de 9 anos, mas ele gosta de dizer que são três em uma — e a vontade de escrever.

— Se isso vai me dar dinheiro ou não, se vou conseguir fazer isso para o resto da vida, não sei. A única coisa que sei que quero e posso fazer é escrever — diz Caco, o codinome de Ricardo Ishak, 32 anos, numa mesa de bar em Paraty, durante a última Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que terminou no domingo passado.

Expoente literário de uma safra cultural paraense que tanto tem chamado a atenção no país — da qual fazem parte nomes como Gaby Amarantos, Lia Sophia, Gang do Eletro, Felipe Cordeiro —, Caco circulava anônimo por Paraty, divulgando o novo livro de poesia. Quando todas as atenções pareciam voltadas aos autores convidados, outros tantos como Caco escondiam no bolso do casaco versos como “das paixões/ o que levo/ é a certeza/ de que a seguinte/ comeu o rabo/ da que lhe antecedeu” (do poema “69”). Ou “não sei dizer/ se acredito em Deus/ ou se sou o próprio/ tentando manter a calma” (do poema “Bis in idem”).

— A Flip é a Disney tupiniquim da literatura, faz a alegria dos novos e nem tão novos autores. Especialidade de escritor sempre foi beber e causar. Paraty é uma festa só. Entre um copo e outro, alguns tantos causos, e-mails trocados, há microcosmos tragicômicos e promessas de novos copos quebrados — dispara Caco, que não esconde a verve ácida em qualquer tema que seja lançado para debate, de política a paternidade — um sujeito “do contra”, digamos, em versão mais doce.

Mas essencialmente do contra. Nas recentes manifestações que se espraiaram pelo país, o poeta não se conformou em exercer a indignação com metáforas. Foi para as ruas. Um dos mais velhos entre a molecada que organizava os protestos, Caco acabou se tornando uma espécie de “orientador” dos jovens. Cruzou a cidade protestando. Acampou em frente à Câmara Municipal. Enfrentou a polícia. Filmou os abusos. E escreveu posts indignados.

— Belém é uma das poucas cidades que não conseguiram sequer baixar as tarifas de ônibus depois de todos esses protestos — criticou Caco — O Pará está sem governador há meses, afastado por um problema de saúde. É um estado sem comando. E os absurdos que acontecem lá não chegam aqui.

“Não precisa dizer eu também” é seu segundo livro (o primeiro, “Dos versos fandangos ou a má reputação de um estulto em polvorosa”, foi lançado em 2006). Caco começou a escrever aos 18, no zine “Macacada Fashion”. Passou a resenhar para o site literário “Capitu”, teve um blog, e antes de mandar a carreira como advogado para a casa da Susan Miller, foi dar aulas de inglês. Descobriu um linfoma, e o tratamento em São Paulo o fez escrever ainda mais. Foi colunista da revista do Lobão, teve contos publicados na coletânea “Poesia Sempre”, da Biblioteca Nacional, e em projetos literários organizados pelo escritor gaúcho Paulo Scott.

— O Caco é uma das grandes promessas da poesia contemporânea — elogia Scott, que participou como convidado da Flip na mesa “Formas de derrota” — Ele ainda não encontrou um formato mais palatável ao gosto acadêmico ou editorial, mas acho isso bom. Ele é correto na procura por uma linguagem. E tenho certeza de que ele já tem uma linguagem própria, o que é bastante incomum.

(Revista O Globo, 14/07/2013)

nota do entrevistado: não estou na organização do movimento. obrigado, mariana. belo texto. pra casa da susan miller.

About caco ishak

deu pau no servidor da verbeat
This entry was posted in all real, articulices caquéticas, blissett, clipping, papo-furado. Bookmark the permalink.

Leave a Reply

Fill in your details below or click an icon to log in:

WordPress.com Logo

You are commenting using your WordPress.com account. Log Out /  Change )

Twitter picture

You are commenting using your Twitter account. Log Out /  Change )

Facebook photo

You are commenting using your Facebook account. Log Out /  Change )

Connecting to %s